terça-feira, 9 de setembro de 2008

Balzaca World

Era uma mulher adulta agora,e como se essas duas palavras já não pesassem suficientemente juntas,era uma mulher adulta solitária.
Ziguezagueava entre o turbilhão de pessoas apressadas que pareciam irritadas com a leveza dos seus passos.Porém eram passos leves de quem queria estagnar,muito diferentes de passos tranquilos.Talvez se andasse com a a cabeça erguida os passantes pudessem ver isso em seu olhar,mas de que valeria?Continuariam a ser vultos que a cumprimentariam apenas com expressões.''Por que demorei tanto para perceber?”ser perguntava.Mas sabia que na verdade lhe faltava era aceitar.
Quanto tempo passara?Vinte,trinta anos?Ela pouco notara em sua rotina pálida.Amigos?Um a consumia demais e o outro era gentil mas superficial.O cigarro e o “pretinho básico”.Os de carne e osso já tinham se casado e tido filhos.
Teve o insight quando a idade e o cigarro não deixavam mais o pretinho básico cumprir seu papel.E então o descartou assim como as verdades que só os bons amigos dizem antes de os perdermos.
Lembrou da última vez que visitara algum amigo e como suas casas eram sempre repletas de porta-retratos preenchidos por fotos de “família feliz”.
Chegou em seu apartamento.Tão clean e minimalista quanto seu coração.Estirou-se num divã,tirou os sapatos com os pés,pôs outro cigarro na piteira.Olhava para o teto enquanto soltava fumaça pelo canto da boca.Tateou desajeitadamente o chão com uma das mãos até encontrar a taça de martini.Tornou a soltar fumaça pela boca.
“Que bom que não tenho uns capetinhas daqueles,assim você continua sempre assim,lindão!Sabia que você é exatamente como eu sempre quis?”Falou isso de forma pateticamente sedutora,soltou um beijo para o ar.
Roncos...Roncos?Acendeu o abajour.Então era um sonho.Ensaiou tacar o livro da cômoda no “maridão”,mas um espelho a sua frente fez com que na cara amarrada aflorasse um sorriso,e por fim,uma gargalhada.O mesmo espelho mostrava-lhe rugas,e as rugas,lembranças de tempos bem vividos.

Nina

Tudo começou no seu aniversário de 8 anos.Dona Cocótinha lhe deu os parabéns e falou: -Parabéns Nina,tome aqui,é só uma lembrancinha! Mal sabia Dona Cocótinha que criança leva tudo ao pé da letra.Nina nunca mais foi a mesma e Dona Cocótinha ninguém nunca mais viu. Desde então,sempre sentia saudade do passado.Por isso nem notava que vivia.As vezes encontrava com conhecidos na rua e lhes espantava a forma como ela lembrava detalhes de acontecimentos que nem lembravam que ela estava presente.Mas estava?provavelmente estava numa situação anterior,como naquele momento.Enfim lhe perguntavam de como andava a vida agora: a resposta vinha monossilábica e o olhar perdia o brilho.Apressava-se em se despedir e seguia a passos largos e confusos. Sua casa era colorida pois remetia-lhe a infância.Espelhos não tinha,em vez disso fotos.Fotos de momentos especiais que não podia esquecer e se a perguntassem se gostaria de revivê-los ela responderia incansavelmente que sim. Essa sua forma de passar a vida afastou os amigos.Mas sabe que ela nem percebeu?Fazia todo mês uma nova excursão e trazia novas fotos para sua coleção:um novo lugar com um grupo enorme de "amigos" alegres.Se deliciava dias! Aos 30 anos Nina resolveu fazer uma festa de aniversário novamente afim de juntar todas as pessoas que tinha na lembrança.O tema seria "O castelo rá-tim-bum" uma série que Nina adorava na infância.Muitos convidados vieram pela curiosidade de saber como Nina estava e por saber que reencontrariam velhos conhecidos graças a sua excentricidade. Foi só no fim da festa,quando Nina estava comendo os docinhos que sobraram,que a senhorinha frágil entrou.Fazia tempo,mas Nina podia se lembrar de Dona Cocótinha."Meus parabéns Nina,tome aqui seu presente."